quarta-feira, julho 26, 2006

Leminskiando 2

Erra uma vez

nunca cometo o mesmo erro
duas vezes
já cometo duas três
quatro cinco seis
até esse erro aprender
que só o erro tem vez


(queria leminskiar aqui até a Alice Ruiz...)

Leminskiando...

vão é tudo
que não for prazer
repartido prazer
entre parceiros

vãs
todas as coisas que vão

quinta-feira, julho 20, 2006

Para Rafael

Apesar das ruínas e da morte
Onde sempre acabou cada ilusão
A força dos meus sonhos é tão forte
Que de tudo renasce a exaltação
E nunca as minhas mãos estão vazias

("E Depois de uma Tarde", de Sophia de Mello Breyner)

sábado, julho 15, 2006

Procura-se um desesperado desesperadamente (por Tati Bernardi)

O sorriso congelado e quente, nenhuma cor diferente na face, nenhum tique revelando descontrole, nenhum estalo nas mãos, os olhos com o mesmo brilho tranqüilo e inabalável de sempre.
Era a morte para Clarice saber que ele não morria por ela. Ela queria sangue, lágrimas, gritos, suores, feridas e murros no ar libertando um corpo retesado em disfarces. Ela queria ver o desequilíbrio surgir de dentro do seu peito de pedra para sentir que valia a pena correr o risco de se relacionar. Quem em sã consciência neste mundo louco e incerto pode ser verdadeiramente calmo e feliz sempre? Como uma pessoa pode manter a cara de capa de revista sabendo que não se controla absolutamente nada nessa vida?
Tudo isso na sua cabeça comprometida em sentir sem freios: a certeza que amar enlouquecia, corroia, dava medo, dava um ciúme filho da mãe, dava uma saudade idiota de mulherzinha romântica, uma vontade besta de estar junto o tempo todo como uma mulherzinha sem vida própria. Ela estava vendida, achava cada dia mais que amar era uma escravidão e se enxergava pequena naquela mão linda e forte. Ela se sentia esmagada pela certeza firme de punhos cerrados que não demonstravam sentimentos.
Eu amo, eu entendo, eu desculpo, eram falas mal ensaiadas de um roteiro pobre. Ela preferia ouvir eu enlouqueço, eu estremeço, eu odeio. A negação do amor era o verdadeiro amor, o amor que não cabe, que extrapola, que não se aceita, que não cabe em si, que não se agüenta, que foge o tempo todo em círculos. A cada frase pronta e controlada de um amor ponderado, Clarice se despedaçava em angústia por querer mais. Aquele amor refilado era tão pouco que a ofendia.
Assim ela queria que fosse a vida: um filme louco que só os sensíveis metidos a intelectuais conseguem fingir que entendem, mas no fundo ninguém entende nada. A verdade era admitir o tempo todo a loucura de estar aqui e de não entender um cacete.
Mas ele apenas sorria, duro para as fraquezas e mole para as tensões, ele apenas sorria para as despedidas, paras as impossibilidades, para as dúvidas, para os finais de domingo banais e sem emoção. Ele apenas sorria para a vida que segue sem maiores surpresas e se entedia sem maiores perdas.
Ele sorria como o Coringa, programado para esconder um menino apavorado como qualquer outro que tem fígado, sorria como o Bob, o cara de borracha que ela espancava na aula de boxe, sorria como o palhaço chorando no quadro que aterrorizou tanto a sua infância, sorria como queremos acreditar que os mortos fazem quando partem em paz. Clarice mais uma vez termina tudo por não agüentar o cuspe invisível que aquele riso fácil lhe causava e sai solteira com suas amigas.
Fernanda está usando um sobretudo lindo com uma blusa decotada embaixo, Ane está mais magra de tanto malhar, o quadro com a natureza morta surrealista é over mas num contexto geral faz o restaurante ficar mais bacana. Clarice só consegue enxergar o superficial do mundo, porque se tocar sua alma, ela pode se espalhar em pó por todos os cantos do planeta.
O garçom não é um modelete estudante de teatro, é um garçom tradicional, graças a Deus. O banheiro do restaurante é limpinho, o que dá a primeira pontinha de esperança em sua alma preenchida de decepções, alguém escreveu "o ser humano é uma bosta" ao lado do vaso sanitário e Clarice lembra de Fernando Pessoa "não sei conviver com os homens meus irmãos na terra".
Clarice está quase tocando sua alma, não, não deve, ela ensaia novamente o sorriso plástico e escuta sem ouvir a conversa de Fernanda e Ane, algo sobre a nova neurose por alimentos sem agrotóxico. Ela queria engolir um balde inteiro de veneno, mas ninguém percebe, seu sorriso bobo engana a todos.
Sim, ela podia ser ele, ela podia disfarçar, ela podia fazer que não era com ela, e ainda assim estar profundamente sentindo a vida e tudo o que ela tem de insana. Sim, ele podia ser enorme e caótico mesmo usando sua máscara feliz. Vai ver ele a amava tanto, que disfarçar os desarranjos do amor fosse uma prova ainda maior de amor do que sair berrando inconstâncias.
Clarice resolveu simplificar a vida como o ditado do banheiro "o ser humano é uma bosta" e mandar uma mensagem de texto para ele "o amor é uma bosta".
Em cinco minutos, para sua imensa felicidade, ele apareceu disposto a perdoar novamente a sua loucura. Como ele ficava lindo quando sorria.

sábado, julho 08, 2006

Labirintite

No caminho de volta, o mundo parecia fechado para balanço. Ninguém na rua. Teve a impressão que à primeira esquerda que virasse, um cadeado enorme fecharia o caminho.
Crescia cada vez mais o medo de andar por um labirinto conhecido. Fez bem-me-quer com alguns fios de cabelo. E depois desistiu. Concentrou-se em cuidar de si. Se por acaso acontecesse de se perder pelo mundo novamente, estaria bem o suficiente para morar em si mesma.
Chegou em casa, como sempre. Nenhuma mudança no percurso. Tudo parecia estar no mesmo lugar: Seus caminhos, sua alma e os seus olhos. Estranhamente, continuava a temer que as mudanças não fossem visíveis, e que ela mais uma vez lutaria contra um gigante que se instala sorrateiramente na carne dos apaixonados.
Na verdade temia, que os trajetos já percorridos não tivessem mais volta. Agregava sempre uma chave nova ao molho, por precaução. Por desatenção ao que não se vê. Mas qual; Qual das chaves abriria a última e mais esperada porta?
-Eu preciso! Eu preciso de um labirinto desconhecido!

sexta-feira, julho 07, 2006

bombons chineses II

É o amor que carece de profundidade ou somos nós que não éramos predestinados.