sexta-feira, novembro 10, 2006

A Dama e o Vagabundo

Madame acha que é pra eu gostar do mancebo asseadinho, homem bom, do cabelo penteado, carro do ano, com saúde e emprego promissor. A Madame não entende que eu gosto mesmo é de cão vadio, homem doido, malaco véio, malandro da rua. Aquele tipo de cara simpático, neurótico, todo errado, por quem a gente inventa um amor estranho, que te vira do avesso e, mesmo assim, toda revirada, a gente ainda pede: fly me to the Moon?
Sendo bem etnocêntrica, imagino que este tipo de moço seja um tipo que, pelo menos grande parte das mulheres que eu co-nheço, ou seja, com pendor estranho, queira; porém, nem todas aguentam ter um exemplar ao lado. Porque dá defeito, problema, desenvolve TOC, acorda de ressaca, tem cheiro de roubada, enfim, é um daqueles escolhidos, como diria minha avó, com dedo podre. E, de alguma maneira, em algum surto lírico, as mulheres sonham, caladas, quietas, trancadas no quarto, sozinhas na casinha, com o tal homem do cavalo. E é difícil não fingir que aquele cara não é o do cavalo. Não, definitivamente ele não é o do cavalo. Mas ama sem ironia.
- Você merece coisa melhor, diz a Madame.
Desdenho. Haverá coisa melhor que um amor bandido? A Madame não se conforma. Como posso eu, moça de fino trato, boa cepa, com pendor arrogante, ar aristocrático, perder meu tempo com vagabundo? A Madame não cultivou o hábito de assistir Walt Disney.
***
É sem volta porque é em camadas. Está espalhado por todos os cantos, feito poeira, feito dia seguinte daquelas noites, peças de roupa por tudo que é lugar. Não é quartinho escuro que a gente tem a chave pra entrar, se tranca lá dentro, faz merda e depois veste o terno e vai pro serviço. Não, a coisa se impregna, está em tudo, na rotação e translação do mundo, na circulação do sangue, veias e artérias, na rejeição do mundo besta, na reincidente e trágica ida ao mundo besta acompanhada do cavalheiro errado que só ama se for em excesso. E por quem a gente revira os olhinhos.
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Faça sua prece pra que a maluquice escolhida por você seja maluquice mas seja doce, delírio de doido manso, cabra alucinógeno, habitante de mundos fantásticos. E assim, toda obscuridade da loucura destrutiva fugirá de ti. Caso contrário, se tua estrada for da perdição, costure as cicatrizes do teu homem ao cair da noite e deixe ele te dar banhos de Cleópatra ao cair do dia.
***
E lembre-se do conselho da Fada Madrinha: nessas histórias de Dama e Vagabundo, tudo muda quando a Dama percebe que é uma rainha louca. Aí começa a ficar bom, o inferno aqui é mais embaixo.
(Antonia Pelegrino)

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

se eles entendessem....

12/11/06 19:51

 

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